segunda-feira, outubro 29, 2012

Uma noite especial

A ansiedade tomava conta. Pudera, não era um dia (e noite) qualquer. Tentando não se afobar para não estragar a apresentação, encarávamos como mais um show de tantos que já rolaram ao longo dos 6 anos de highway. Mas, com certeza, não era um dia (e noite) qualquer. Um encontro que demorou 6 anos pra rolar. Sempre imaginamos que quando em algum dia isso acontecesse seríamos os novatos da parada. Dividir palco com o Apocalipse (em respeito aos velhos tempos, recuso-me a chamar de CONSPIRAÇÃO APOCALIPSE) era um sonho próximo, mas de distante efetivação visto que os caras tavam parados desde 2005, antes do Arlequim existir. A imaginação me tomava de assalto e fazia-me pensar em diversas conjecturas, de como seria isso. Talvez a que nunca me passava era a de que Paccelli não estaria presente (fisicamente, pelo menos). Restou-me saber que se um isso ocorresse a coisa não seria do jeito que deveria ser. Paccelli é essência nesse processo todo.

Pois bem, os anos se passaram, essas ideias não mais me assaltavam. As impossiblidades enfraquecem algumas vontades. Eis que há pouco mais de um mês o Naldinho Braga nos convidara para uma apresentação no NEC, junto a uma banda que divide o set de ensaios conosco, o Cofe of Life. De imediata aceitação, nunca que imaginaria o que estaria por vir. Pois não é que alguns dias depois o dito Naldinho confirma que o APOCALIPSE VOLTARIA AOS PALCOS PARA A DITA NOITE NO NEC. Por um momento não acreditei, incréu que sou. Passados uns dias vi que a coisa tava tomando forma. Todos se animaram, óbvio. No Arlequim, a gente começou a trabalhar a mente, evitando o que disse acima. Geverson e eu dizíamos que era um ensaio (heresia), que ficássemos relax. Conversando com integrantes do Core, empolgação total deles. Repertório ensaiado, apresentações anteriores executadas a contento, tranquilo. Tava montado e nada de inventar qualquer coisa que pudesse comprometer. Vontade não faltava, pois a noite era espacial, mais que as outras, poderia estar incrementada com adereços musicais afins.



Sobre o que falava acima, daquela ideia de banda mais nova que acompanharia os dinossauros do Apocalipse, mais uma surpresa e constatação de um fato novo. JÁ TEMOS ESTRADA PRA DIZER QUE SOMOS PUTAS VELHAS. Pois é, o vigor do Core of Life e da galera que acompanha seus shows já haviam me mostrado isso. Mas com o caráter da divulgação, a coisa se tornou bastante latente pra mim. Isso é bom. A cena rocker tá se renovando, novos atores e novas atrizes vão surgindo, engrandecendo o movimento. A pretensão da exclusividade passa longe de nossa trupe.

O sentimento juvenil da admiração e do respeito perante os senhores que vi tocar se manifestou fortemente. Os caras do Apocalipse tavam com a bola toda, viris como nos velhos tempos. Pular ao som do Apocal foi uma necessária volta ao tempo, com os pés no presente. Enxergar que essas canções, que me são muito caras por estarem impregnadas em minha construção pessoal, estão a cada dia mais pertinentes, me dá forças pra também seguir em frente com esse tal de Rock'n'Roll, parafraseando a Rita Lee. Foi uma ótima sensação estranha.

Os 3 shows foram do caralho. Não existe expressão melhor pra defini-la. Foi foda! O show do Core of Life foi pra se lascar. Não me surpreendi, pois os caras mandam bem. O repertório, bem executado, é matador. Só clássicos do Hard Rock / Heavy Metal. Foda pra caralho.

Evitando advogar em causa própria, atrevo-me a dizer que gostei de nossa apresentação. O público nos recepcionou muito bem, pularam e se divertiram. As mensagens em algumas canções foram transmitidas com a energia que mereciam, fazendo lembrar que, a despeito da diversão, o mundo continua uma merda. Essa é a proposta do Arlequim e continuará sendo no que depender dos caras que sustentam essa "diversão trabalhosa".

Pois é, foi uma noite e tanto. Nostálgica, atual e bastante pertinente. Como dissemos no Arlequim, "história e presente se juntaram pra brindar"...



quarta-feira, outubro 03, 2012

A solidão e a cidade

Escrever sobre minha estadia pelas bandas de Filipeia de Nossa Senhora das Neves  era algo que relutava a fazer. Nos últimos 13 meses de existência material dedico semanas (precisamente os tais "dias úteis" - expressão encachoeirada de contradições) à capital de nosso Estado. Aqui vim trabalhar (outro conceito escroto esse, o de "trabalho"). Não vou me ater ao trabalho e seu desenrolar. Por hora, registro que gosto. Uma instituição pública, centenária, que durante sua trajetória voltou-se a formação de  técnicos e tecnólogos  produção industrial, que, ao longo das décadas foi ganhando conceitos pedagógicos antenados com o contexto histórico de seu tempo, e que atualmente ganha outra prerrogativa, a da formação acadêmica ampla (ensino, pesquisa e extensão indissociáveis), diversificando suas áreas de conhecimento e modalidades, sem abandonar, contudo, sua função pioneira. É um desafio e tanto, sobretudo no contexto da "coisa pública".

Porém, não é disso que quero discorrer. Falo de minhas "estadia e percepção" da capital, da cidade grande, da "violência da noite, do movimento do tráfego", e da relação dialética entre a cidade (e suas pessoas) comigo. Logo eu, filho único que viveu sua infância em cidade grande, estupidamente grande, em São Paulo, com seus muros e grades. Que depois virou a moeda para o lado provinciano de Cajazeiras... Volto ao eixo e ao modus vivendi dos semáforos, engarrafamentos e enlatados em conserva. Curiosidades da vida. Se é o tal destino, o karma (e DNA), o "plano de Deus para mim", confesso que não sei e muito menos preocupado com isso estou.


[Vez por outra, ao meter o bedelho nos assuntos do cotidiano, adentro assuntos de ampla dominação e sistematização da Psicologia. Como sou um frequentador de tabernas, olho o mundo a partir delas. Isento-me das distorções conceituais, visto que não sou da área e não pretendo ser. Encaminhem suas dúvidas a quem o  é. Conheço dois. Minha inconformada formação em História me dá subsídios para rabiscar sobre algo que incomoda, só isso. Portanto, nada de conferir uma importância desproporcional ao que aqui se posta.]


Um dos motivos de minha estranheza perante a zona urbana por excelência pode ter sido o fato de ter vivido totalmente o intervalo entre São Paulo e João Pessoa em Cajazeiras. Foi justamente o período mais louco da vida do sujeito, a adolescência  São 14 anos de plenitude na Terra do tal Padre. Trabalhei em Sousa durante 3 anos, voando pra casa ao final da labuta diária. Sousa possui um contexto similar ao de Cajazeiras, provinciano cosmopolita. Uma urbe do Sertão é caracterizada pela convivência não harmoniosa de valores, códigos de conduta e ética. Mesmo não convivendo tão pacificamente assim, percebo uma antropofagia entre o velho e o novo nas pessoas forjadas neste meio. Tipo um Seu Lunga que frequenta o teatro, que escuta Bob Dylan, que lê ficção científica e que (infelizmente) exagera no compartilhamento de frases de efeito no Facebook. Diante das distorções históricas do século Xis-Xis e do Rock'n'Roll, todos nós, da província à metrópole, ao menor contato com a contracultura, adquirimos novos sabores (alguns dissabores) e filosofias de vida. É o novo que não anda tão novo assim. Esta abertura universal também trouxe um outro novo (que parece o Benjamim Button, fica cada dia mais novo): o consumismo, o individualismo e a indiferença. E é nesse ponto, essencialmente urbano, tipo um super-urbano, que mais me repulsa pelas bandas da cidade grande. Os "cada um por si e Deus CONTRA todos" (carinhosamente chamado de "cada um por si e Deus POR todos") me soam muito mais estranhos que ver uma roda de pessoas ouvindo Nirvana ou Charles Aznavour em um celular numa pequena cidade "na pinga da meio-dia".

Na grande cidade tudo é privado. As ruas lotadas de veículos (nas auto-pistas nem calçadas existem). As pessoas preferem os espaços privatizados dos Shoppings Centers ou de seus apartamentos do que um papo de boteco. O espaço não-privatizado que o Humberto Gessinger pergunta em "Segunda-feira Blues" ainda respira em nosso interiorzão.

Não quero dizer com isso que "bora simbora morar na rua" ou exageros inerentes de um romantismo que às vezes me soa tão estranho quanto alguém que está ouvindo Nirvana ou Charles Aznavour no celular numa pequena cidade me olha com olhar indiferente quando peço para tocar Roberto Muller ou Reginaldo Rossi. Cultivo intensamente o lance da rede, acompanhada de um livro, um filme e/ou uma cerveja solitária no covil. Meu momento individual é sagrado ao ponto de comprar briga feia para garanti-lo. Porém, não o cultivo ao ponto de criar fungos entre as nádegas e a rede.

Talvez seja normal encarar a cidade grande nessa perspectiva. Não quero dizer que ela é ruim por conta disso. Não, não. Ela lhe dá uma porrada de possibilidades que a pequena urbe não permite. Faz parte. A Terra do Rio Sanhauá sempre foi um diferencial de cidade grande para mim. Talvez por não ser tão grande quanto Sampaulo ou Hellcife. O bairro que resido por aqui possui diversas semelhanças com uma cidade pequena. É uma cidade dentro de João Pessoa não só pela quantidade de habitantes, mas pela áurea, pelo espectro, da praça grandona e dos botecos do bairro com seu público tradicional. Talvez as "pequenas" cidades como Cajazeiras e Sousa sejam uma espécie de bairros que, a partir do """"""desenvolvimento"""""" da humanidade tornar-se-ão grandes cidades, com seus consumismos, individualismos e indiferenças.

Por último e fundamental, toda a minha vida está pelas bandas do sertão. Quase todas as minhas amizades daqui foram construídas lá, com as características de lá. As que vou fazendo por aqui baseiam-se na mesma premissa. São amizades forjadas na ideologia "Copo e Cruz", distante dos Shoppings Centers.